terça-feira, 7 de agosto de 2012

*Aqui dentro é outro mundo

            É, eu fazia, de novo, todas aquelas aulas teóricas para tirar a carteira de motorista, de novo.
            E tinha esse professor que era bombeiro. E tinha essa ninfa do meu lado.
            Esse professor tinha uma cicatriz na ponta do nariz. Porra! Tanta gente por ai morrendo de medo de cicatrizes e esse cara com uma bem na ponta do nariz? Que sorte! Qual é a graça de não ter cicatrizes? Povo burro!
            Acontece que esse professor era sério. E eu tinha lá poucas cicatrizes, louváveis só pela dor que causaram no dia-a-dia. Mas aquela: na ponta do nariz, parecia que apontava bem pra minha cara! Como que denunciando minha pele lisa. Sem história. Que merda, bela merda. As histórias que eu tinha eram de poucas ou mais vergonhas. Tá bom, vá lá, tinha muita risada também. Tinha muita história boa.
            Eu tinha chegado lá com minhas pernas, mas sem mérito meu. Mas vá lá, dane-se, a culpa não é minha.
            E essa ninfa do meu lado nunca falava nada. Era uma voz que saia por uma fenda nas pedras. Que raiva…todo aquele pecadinho pra nada. Não tinha cicatrizes ou histórias pra contar. Bela merda! Mais um produto organicamente industrializado. Era como uma foto de um quadro de Dalí ou Picasso: não era arte.
            Eu passava a tarde inteira naquela sala. Entrava lá pelas 13h40min e saia às 18h50min. Ô dia ruim…
            A manhã é branca e a tarde é colorida. E tinha uma larga janela na sala da onde dava pra ver a tarde correr nos carros, no comércio, nas pessoas e no mundo lá fora. Eu adoro a tarde. O sol fazia pilhérias de mim. Dava pra ver ele rindo daquele jeito escroto que faz coçar o ódio na consciência (ou inconsciência) da gente. Mesmo amigos fazem isso; e ele era meu amigo. Mas amigos a gente perdoa; os outros: ou se dá uma porrada na cara, ou foda-se alguns dias depois (ou não se esquece).



            Ô dia ruim, ô dia sem jeito. Mas é só um dia; após outro e mais outro e amanhã tem mais um e uma hora acaba e pronto. Acabou.
            E eu e a ninfa não tivemos nada além de aulas naquelas todas tardes que correram. Acho que podia torná-la uma obra de arte de um jeito ou de outro. Que pena, ninfa, você perdeu…e eu nem a conhecia; que belo artista eu sou…
            Tinha um cara, também, que não parecia ter sido beneficiado pelo destino, mas dane-se também, a culpa lá é minha? Quem se importa? Que é ele? Foda-se! Sou artista e o 

dia lá fora é lindo! Danem-se os homens.
            Aquele sim era um pecado, há não ser pelos pés, mas foda-se também.
            O dia lá fora é lindo e é só um dia. Um só hein?!

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